terça-feira, 18 de agosto de 2009

O Jardim das Delícias

Um bosque obscuro surge ao longe.


Como uma criança endiabrada, não fujo, salto o muro e aventuro-me nele. Os sons e os cheiros enfeitiçam-me, de mansinhos, fazem-se meus vizinhos. O coração dispara, o corpo adquire novas formas, a excitação toma conta de mim. Aquilo que era silvestre transforma-se num jardim, não de canteiros em flor e de cantos verdejantes com passaredo chilreante, como quadro de mau gosto de pintor pouco composto, mas sim de encantos electrizantes em que corpos nus se entrelaçam numa sinfonia bacante.


Algumas mãos, que sobram da tela saturnal, apertam-me e obrigam-me a deitar, despem-me e afogam-me nas carnes doces e belas que desabam naquele mural. Não tenho tempo de reagir, a fêmea mais fêmea, já de mim se apoderou e, qual ninfa ardente, procura abrigo nos montes que o meu forte elevou.




Os sons alteiam-se, confundem-se com os odores quentes dos ais, quero mais, muito mais, ir até ao fim, despejar sobre a minha sereia a raiva feita da chama que explode em mim, como uma lava desvairada, quente e ensaimada, que tem pressa por morrer no cais onde mergulham os meus desejos mais sediciosos de delfim em busca do cálice do poder com quero dormir eternamente.


Sinto o momento final, avanço estoicamente sobre a minha conquista, prazer à vista, apresso-me a gritar o meu deleito, só que outra voz chamo, é dor que clamo, por uma espada cravada no peito. Ela ri, elas uivam. Espinhos rançosos, invejosos, já cravam os sons do fim, quem foi a Madalena que ousou invadir a minha arena e pintou com sangue de Messalina aquilo que fora, ainda agora, o meu jardim e apagou o meu fogo eterno, de sessentão, com gasolina.

Mas senhor Ministro, o que é isto? Estão lá fora os jornalistas para o espremer, comunistas, fascistas, mesmo socialistas e outros populistas, também eles, afinal, estendem a toalha da moral para o comer, já para não falar em escritores de grande gabarito que, de faca e garfo, salivam com o deleite do manjar de sua eminência, servido às rodelas de decência, em azeite, mediterrânico, do melhor, frito.

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